Vencedores
O anúncio dos vencedores do Oceanos aconteceu pela primeira vez em um país de língua portuguesa do continente africano. Uma comitiva do prêmio – formada pela gestora cultural e coordenadora do Oceanos Selma Caetano, a jornalista e curadora Isabel Lucas e o escritor Luís Cardoso, vencedor do Oceanos 2021 – foi a Moçambique para a realização de uma programação literária de dois dias, com escritores de Brasil, Moçambique e Portugal.
A cerimônia de anúncio aconteceu em Maputo, no Centro Cultural Brasil-Moçambique, e foi transmitida ao vivo pelo site do Itaú Cultural e pelo canal do Oceanos no YouTube.
O livro Líbano, labirinto, da escritora portuguesa Alexandra Lucas Coelho, publicado em Portugal pela Editorial Caminho, ficou em primeiro lugar. Essa é a primeira obra de não ficção a vencer o Oceanos – Prêmio de Literatura em Língua Portuguesa.
Nas palavras do curador do Oceanos para o Brasil, Manuel da Costa Pinto, “a premiação de Líbano, labirinto tem – para além do reconhecimento de sua força literária – um grande significado simbólico para o Oceanos: pela primeira vez, o prêmio é atribuído a um livro inscrito na categoria ‘crônica’. Alinhavando histórias individuais e coletivas desse país tão ancestral quanto conflagrado, o livro associa o olhar cirúrgico sobre a realidade social e política a uma sensibilidade que a todo tempo interroga a própria experiência, dentro da tradição que leva do ensaio (em sua acepção original) à crônica contemporânea, passando pela linhagem dos grandes cronistas históricos portugueses, que fizeram da viagem o mote para flagrar o espanto diante da alteridade”.
Para Joselia Aguiar, jornalista e curadora literária que fez parte do júri que elegeu a obra, “nessa coleção de pequenas histórias de viventes no Líbano, Alexandra Lucas Coelho constrói um livro poderoso sobre os afetos e a guerra, a angústia e a esperança. A obra combina e atualiza gêneros de tradição: a crônica, a grande reportagem, a narrativa de guerra, o testemunho e a memória”.
O romance Museu da Revolução, do escritor moçambicano João Paulo Borges Coelho, publicado em Portugal também pela Editorial Caminho e no Brasil pela Kapulana, conquistou o segundo lugar. É a segunda vez na história do Oceanos que um livro moçambicano se classifica entre os vencedores – na edição de 2018, o livro de poemas O deus restante, de Luís Carlos Patraquim, ficou entre os premiados.
O professor moçambicano Artur Bernardo Minzo, que também compôs o júri final do Oceanos, destacou no romance a abordagem crítica das funções dos museus, da memória das pessoas e dos próprios livros como “utensílios” de construção das identidades nacional e universal. “Museu da Revolução esgravata as diferentes formas de (in)compreensão sobre as ‘guerras’ do projeto humano sempre inconcluso, destacando-se a guerra suprema pela vida e os ‘subconjuntos’ correlacionados: a guerra colonial em si, a guerra de tropas contra tropas inimigas, a guerra de países e suas ideologias antagônicas, a guerra de desejo de soldados contra o corpo de mulheres desprotegidas. Mas, sobretudo, é a metáfora assombrosa da desqualificada e repugnante negação de valores como a vida, o amor, a paz, amizade, a verdade e a razão.”
Na terceira posição, ficou o romance O som do rugido da onça, da brasileira Micheliny Verunschk, publicado no Brasil pela Companhia das Letras, que venceu também o Prêmio Jabuti na categoria Romance Literário.
De acordo com a poeta brasileira Júlia de Carvalho Hansen, também membro do júri do Oceanos, “O som do rugido da onça é um acontecimento literário raro. Afinal, o livro transforma os tempos passado e futuro, criando um romance histórico que é também contemporâneo. Embora apresente parentescos com autores como Guimarães Rosa ou Mia Couto, enquanto apreende perspectivas de conhecimentos e mitos ameríndios, a escrita desse romance de Micheliny Verunschk se faz única, reinventando com sofisticação e alegria a língua portuguesa. Além da rica originalidade textual, sua narrativa transporta e utiliza dentro da ficção questões urgentes aos debates contemporâneos: sejam elas ligadas à decolonialidade; ao reconhecimento da potência dos saberes da floresta ou mesmo da necessidade tão sutil como firme de operar a literatura através de posturas feministas”.
O Oceanos é realizado em três etapas de votação até chegar aos vencedores. Ao todo, foram 7.881 leituras realizadas pelos três júris que se sucederam na seleção de semifinalistas, finalistas e vencedores.
O valor total da premiação é de 250 mil reais, sendo 120 mil para o primeiro colocado, 80 mil para o segundo e 50 mil para o terceiro.
Júri final
Participaram do júri final, que leu e avaliou os dez livros finalistas para escolher os três vencedores, os brasileiros Cristhiano Aguiar, Guilherme Gontijo Flores, Joselia Aguiar e Júlia de Carvalho Hansen; o moçambicano Artur Bernardo Minzo; e as portuguesas Ana Cristina Leonardo e Helena Vasconcelos.
Autores premiados
Alexandra Lucas Coelho nasceu em Lisboa, Portugal, em 1967. Tem 14 livros publicados, entre ficção, não ficção e infantojuvenis. Trabalhou por cerca de 30 anos como repórter, cronista e editora, na rádio e na imprensa. Recebeu vários prêmios de jornalismo e de literatura. Em 2012, recebeu o Grande Prêmio da Associação Portuguesa de Escritores (APE) pelo seu romance de estreia, E a noite roda.
João Paulo Borges Coelho nasceu no Porto, Portugal, em 1967, e naturalizou-se moçambicano. É escritor, historiador e professor da Universidade Eduardo Mondlane, em Maputo. Publicou 13 livros, entre os quais destacam-se As visitas do Dr. Valdez, vencedor do Prémio José Craveirinha, e O olho de Hertzog, vencedor do Prémio LeYa.
Micheliny Verunschk nasceu em Recife, Pernambuco, em 1972. Escritora e historiadora, é também mestre em Literatura e Crítica Literária e doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC São Paulo. Publicou dez livros, entre poesia e prosa, como Geografia íntima do deserto, Nossa Teresa – Vida e morte de uma santa suicida, que venceu o Prêmio São Paulo de Literatura, e O movimento dos pássaros.